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Brasil registra alta de 30% nos episódios de acidentes no trabalho

Pandemia precariza relação entre patrões e empregados e contribui para prejudicar a saúde, física e psicológica, de funcionários, dizem advogados

Vinte e sete de julho foi marcado pelos 50 anos do Dia Nacional da Prevenção de Acidentes de Trabalho, considerado marco histórico na luta dos trabalhadores por melhorias nas condições de segurança e saúde. A data se tornou oficial em 1972 e simboliza o início do Serviço Obrigatório de Segurança e Medicina do Trabalho em empresas com mais de 100 empregados. Atualmente, de acordo com a OIT (Organização Internacional do Trabalho), a cada 15 segundos morre uma pessoa por acidente de trabalho no mundo. Isso significa mais de 6.300 por dia e 2,3 milhões por ano.

No Brasil, em 2021, foram comunicados 571,8 mil acidentes e 2.487 mortes associadas ao trabalho. O número representa aumento de 30% em relação ao ano anterior, segundo o Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho. O Brasil ocupa o quarto lugar no ranking mundial de mortes por empregos formais, atrás da China, Índia e Indonésia, com oito óbitos a cada 100 mil vínculos de emprego entre 2002 e 2020. As menores taxas de mortalidade foram registradas no Japão (1,4 a cada 100 mil) e no Canadá (1,9).

Segundo especialistas do Direito do Trabalho, números cresceram após a pandemia de Covid-19, que gerou efeitos nocivos nas relações do trabalho como, por exemplo, a precarização. “É fato que a pandemia acentuou a situação de precarização das relações trabalhistas em algumas atividades laborativas como, por exemplo, dos empregados de aplicativos. Isso porque as empresas não respeitam os limites legais da legislação trabalhista, como jornada de trabalho, direito aos descansos e intervalos. Essa situação de precarização tem culminado em índice grande de adoecimento do trabalhador, tanto de natureza física quanto psicológica”, diz a advogada Cíntia Fernandes.

Por causa dos problemas provocados pela pandemia, segundo especialistas, números continuarão em curva ascendente nos próximos meses. “A sobrecarga de trabalho, a falta de treinamento sobre uso de EPIs, equipamentos de trabalho não adequados e a própria contaminação por Covid estão entre causas que fazem com que o número de acidentes aumente durante a pandemia”, aponta Lariane Del Vecchio.

A especialista ressalta que afirma que vários trabalhadores estão expostos a jornadas extenuantes, o que agrava a situação e provoca acidentes e risco de contágio pelo vírus. “Nem sempre o trabalhador está conseguindo vaga em atividade que garante integridade de sua saúde física e psicológica. Mesmo os formais estão sendo expostos a situações degradantes. Os da saúde estão adoecendo; os de serviços considerados essenciais estão sendo expostos a longas jornadas”, analisa.

Lariane destaca que o trabalho prestado para plataformas digitais se tornou um instrumento para obtenção de rendimentos necessários para sobrevivência na pandemia, mas gerou problemas. “Na maioria dos casos, é relação de emprego mascarada na falsa sensação de empreendedorismo, levando a jornadas abusivas, falta de proteção à saúde do trabalhador e não recolhimento ao INSS”, alerta.

Na visão do advogado Ruslan Stuchi, sócio do Stuchi Advogados, as relações de trabalho estão sofrendo uma grande transformação. “Com a situação de mercado comprometida devido à pandemia, em especial em países como o Brasil, o aumento da desigualdade e da pobreza é inevitável. Por outro lado, a pandemia pode servir como um grande laboratório para se testar novas relações de trabalho, novas tecnologias, sistemas mais eficientes e uma nova organização dos negócios. O mercado de trabalho refletirá sobre as mudanças socioculturais que momentos como esse podem provocar. Há várias questões que vinham sendo discutidas antes e que precisam ter o debate reorganizado. As relações serão repensadas, mas ainda não sabemos o resultado disso.”

Segundo o Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho, a operação de máquinas e equipamentos é a maior causadora dos acidentes, somando 15% dos casos. Ano passado, esse percentual se manteve elevado, em 16% do total. Assim como ocorrido em anos anteriores, acidentes ocupacionais envolvendo máquinas e equipamentos resultaram em amputações e outras lesões com uma frequência 15 vezes maior do que as demais causas, gerando três vezes mais acidentes fatais que a média geral. A situação se agravou ainda mais nos dois anos de pandemia, em 2020 e 2021, quando foram registradas 33 mil CATs (Comunicações de Acidentes de Trabalho) e 163 mil afastamentos com casos de Covid-19.

A prevalência de acidentes, doenças e mortes no exercício das atividades laborais é indicador de desigualdade social e está atrelada à informalidade, à falta de apoio jurídico e assistencial e ao menor acesso aos serviços de saúde e educação, segundo especialistas. “A pandemia teve grande impacto nas relações de trabalho. Claro que não se pode generalizar, mas há situações em que houve supressão de direitos e extinção do contrato de trabalho”, avalia a advogada Cíntia Fernandes.

Auxílio-doença ampara trabalhador

Um dos benefícios que o trabalhador possui em caso de acidente relacionado ao trabalho é o auxílio-acidente. “É bastante comum que o trabalhador desconheça o direito básico de receber o auxílio-acidente durante toda a vida profissional, sempre que sofra algum tipo de ocorrência que gere sequela e torne a realização da atividade laboral um pouco mais difícil. O benefício é concedido pelo Instituto Nacional do Seguro Social, que exige perícia médica para aprovar o pagamento mensal de um adicional ao segurado, mesmo que ele volte a trabalhar na mesma função”, relata o advogado João Badari.

O especialista em Direito Previdenciário destaca que o benefício não cessa quando se retoma a rotina de trabalho, diferentemente do que ocorre com o auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez. “É preciso destacar que não importa se o acidente ocorreu durante a atividade profissional ou em um momento de folga. Para ter o direito, basta a comprovação de que houve sequela permanente que impactou negativamente no desempenho laboral. Por exemplo, um trabalhador que sofra um acidente de moto durante uma folga e perca o dedão da mão, consequentemente, terá a capacidade para o trabalho reduzida. Assim, ele terá direito a receber o auxílio-acidente do INSS”, diz.

O valor pago do auxílio corresponde a 50% do salário de benefício e funciona como um tipo de indenização para o segurado que contribui com o INSS. Após a reforma da Previdência, a definição do valor do auxílio-acidente é feita pela soma de todos os salários com contribuição a partir de julho de 1994, dividida pela quantidade de meses contados. Basta pegar a média dessa conta e descontar 50%.

Antes da reforma previdenciária, era possível descontar os 20% das menores contribuições ao INSS, o que aumentava um pouco a média. Desde 13 de novembro de 2019, data da promulgação das regras atuais, isso não é mais possível. No entanto, caso o trabalhador tenha sofrido o acidente com sequela antes da entrada em vigor da nova legislação e ainda não tenha buscado o auxílio em questão, ele poderá requerer o benefício com o desconto dos 20% das menores contribuições ao instituto.